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New Horizons chega a seu destino e nos oferece a imagem mais nítida de Plutão

  • Vitório Zago
  • 21 de jul. de 2015
  • 10 min de leitura

A sonda espacial New Horizons, depois de 9,5 anos de viagem, chegou na última terça, dia 14, pela manhã, 8h25 de Brasília, ao seu destino, o longínquo planeta anão Plutão, que nesse momento de sua órbita está a quase 5 bilhões de quilômetros de nós ou do Sol.


Bem, considerando essa imensa distância, os 150 milhões de quilômetros ou 1 UA (Unidade Astronômica) entre o Sol e a Terra são desprezíveis, pois a distância de Plutão é cerca de 50 vezes a distância entre nós e nossa estrela, o Sol. Plutão pode chegar até 7,5 bilhões de quilômetros em função de sua órbita elíptica, oval, que tem grande excentricidade, o que na prática significa que ele se aproxima do Sol e depois se afasta bastante. A órbita da Terra também é uma elipse, de pouca excentricidade, quando observada de longe é quase uma circunferência.


Na última terça-feira, dia 14, a New Horizons deu um sobrevoo, passando o mais perto de Plutão em sua missão, a 12,5 mil quilômetros da superfície dele. Por enquanto recebemos imagens de baixa resolução. Em sua passagem por Plutão, a New Horizons coletou uma enorme quantidade de dados, que começaram a ser enviados para a Terra ainda esse mês, mas o envio do pacote todo só se completará em novembro de 2016!


Ela ficou sem contato com a Terra nessa maior aproximação horas antes, desligando seus instrumentos de comunicação, para abordar e coletar esses dados, desde fotos até outros dados. Esse silêncio durou 22 horas e causou certo receio à equipe da NASA em Terra. Mas quando a sonda capturou os dados planejados e retornou sinal para a Terra, muitos aplausos ecoaram pelo ambiente, e uma enxurrada de mensagens de congratulações começaram a chegar para a equipe, entre elas a do físico inglês Stephen Hawking, que sempre manifestou grande interesse pela astronavegação e conquista espacial, sendo inclusive ardoroso fã de ficção científica, em especial de Star Trek (Jornada nas Estrelas), série de TV em que chegou a participar de um episódio da Nova Geração em 1993, “Descent - Part I” (“Queda – Parte I”), o último episódio da sexta temporada das sete temporadas dessa geração de Star Trek, em que interpretou a si mesmo, ao lado de atores que interpretaram Isaac Newton e Albert Einstein.

Imagens da superfície de Plutão

A Imagem mais nítida de Plutão até hoje foi obtida pouco antes de sua máxima aproximação ao planeta anão. Antes tínhamos imagens borradas da própria New Horizons quando se aproximava nos últimos meses, e outras borradas, sem nitidez, feitas pelo Telescópio Espacial Hubble, em órbita da Terra. Essa imagem enviada pela New Horizons tem mil vezes mais nitidez que a melhor do Hubble. E ela tinha um... coração! Uma enorme área aparentemente homogênea da superfície de Plutão, que com igual imaginação e poesia, pode também ser interpretada como uma ave com as asas abertas. Interpretações que podem enriquecer toda uma nova mitologia sobre esse distante mundo.


As câmeras da sonda New Horizons são extremamente potentes e são capazes de observar com detalhes a cidade de Holambra ou o Parque Portugal (Lagoa do Taquaral) em Campinas a 12 mil km de altura ou distância. Podemos fazer uma analogia desse sobrevoo da New Horizons. Imagine a sonda sendo um micróbio. Esse micróbio realiza uma viagem de Campinas até o Rio de Janeiro, percorrendo quase 500 quilômetros. Ao chegar ao seu destino, o sobrevoo dessa sonda micróbio ocorre a uma distância de um metro de uma bola de futsal. Essa foi a aventura da sonda espacial da NASA.


A missão custou US$ 720 milhões. A New Horizons tem uma massa de 478 quilos e uma largura de 2,7 metros, altura de 0,7 metro e comprimento de 2,1 metros (tamanho da antena), e é a sonda mais rápida já construída, chegando a 58 mil quilômetros por hora! Em nove horas apenas, a New Horizons cruzou a órbita da Lua, o que as missões Apollo nas décadas de 1960 e 1970 levaram de 2 a 3 dias para fazer! Ela saiu em 19 de janeiro de 2006, levada ao espaço pelo foguete Atlas V, do Cabo Canaveral na Flórida, Estados Unidos. Foram quase nove anos e meio de viagem!


Em seu longo percurso, a New Horizons passou bem perto de Júpiter, em 28 de fevereiro de 2007, onde exercitou seus sistemas e instrumentos, posicionando-se para ganhar um planejado impulso gravitacional, atingindo por um tempo curto a velocidade espetacular de 83 mil km por hora, fazendo a sonda economizar cerca de 3 anos e 8 meses de viagem. Esse impulso garantiu à sonda chegar mais rápido a Plutão, pois levaria cerca de 14 anos sem esse impulso. Por outro lado, a sonda passou pelo planeta anão a uma velocidade maior também e por um tempo menor.


Após passar por Júpiter, a New Horizons entrou num estado de hibernação por 7 anos, ou seja, cerca de dois terços de sua viagem, “acordando” algumas poucas vezes nesse tempo para um sinal de “oi”. Ela passou também pelas órbitas de Saturno em 8 de junho de 2008 (sua maior aproximação ao planeta dos gigantes anéis), de Urano em 18 de março de 2011 e de Netuno em 25 de agosto de 2014. E em 6 de dezembro de 2014, ela foi despertada da hibernação, quando então começou a mirar e observar Plutão, ainda muito distante, com imagens ainda pouca definidas.


​​Além das imagens, a sonda estudou a fina e peculiar atmosfera de Plutão, a geologia dele e a ação do vento solar no planeta anão. Conseguiu imagens detalhadas da superfície, com cordilheiras de montanhas com cerca de 3,5 mil metros de altura. A New Horizons, em sua missão, coletou muitos e muitos dados, que levarão, depois de chegar à Terra todo o pacote de dados, cerca de ano para serem de fato processados, analisados. O tempo de envio dos dados para Terra por transmissão de rádio (na velocidade da luz) é de 4h25. E a sonda coletou cem vezes mais dados do que poderia enviar de uma vez. Assim, apenas acabou a missão de chegada, e a missão continuará com o envio desses dados à Terra. A New Horizons continuará enviando toneladas de dados nos próximos 17 meses, e por isso os estudos com esses dados sobre Plutão, um mundo muito distante que ainda sabemos muito pouco, estão só começando!


Apesar da enorme distância, o sistema de Plutão é bastante complexo e rico em atividades físicas e químicas. Por estar tão longe, a temperatura de Plutão é em torno de -230 graus celsius, podendo variar cerca de 10 graus para cima ou para baixo, dependendo de seu momento em sua órbita que se completa a cada 248 anos terrestres. Sua rotação é mais lenta que a da Terra, sendo seu dia equivalente a 6,4 dias terrestres. Essa temperatura se aproxima do zero absoluto, que é de -273,15 graus celsius ou 0 kelvin. É tão frio que neva nitrogênio lá! Sua fina atmosfera gelada de nitrogênio e metano produz flocos de neve de nitrogênio que cobrem parte da superfície.


Sobrevoo das planícies e montanhas geladas de Plutão

Plutão possui 5 satélites conhecidos, 4 bem pequenos. O maior deles é Caronte, descoberto em 1978. Os pequenos foram descobertos recentemente. Hidra e Nix foram descobertos em 2005, Estige em 2011 e Cérbero em 2012. Caronte é sem dúvida o mais interessante, pois ele tem quase a metade do diâmetro de Plutão, que é de 2730 quilômetros, ou seja, Plutão tem cerca de dois terços do tamanho da Lua. O diâmetro de Caronte é de 1207 quilômetros. Diferente de Plutão, Caronte não tem atmosfera e provavelmente perdeu seus gases há muito tempo.


Por ser tão grande em relação à Plutão, muitos astrônomos consideraram o sistema de Plutão formado não por um, mas por dois planetas (ou planetas anões), Plutão e Caronte, pois o centro de massa do sistema, fica fora de Plutão, entre Plutão e Caronte, mas mais perto de Plutão, com todo o sistema girando ao redor desse centro de massa. Bem diferente do Sol e da Terra, por exemplo. O Sol tem cerca de 99,8% da massa de todo o Sistema Solar, o que faz com que todos os corpos girem basicamente ao redor dele, já que o centro de massa se localiza praticamente no centro do Sol, que também gira ao redor do centro de massa do Sistema Solar. No caso do sistema Terra-Lua, a Terra é bem maior que a Lua, o centro de massa se encontra também no núcleo do nosso planeta, mas não tão no centro. A Terra e a Lua giram ao redor desse centro de massa do sistema Terra-Lua, ou basicamente podemos dizer que a Lua gira ao redor da Terra.


Plutão tem sua órbita ao redor do Sol bem inclinada em relação ao plano de órbitas dos planetas, e além disso tem o seu plano de órbita também inclinado, ou seja, os polos apontam para o Sol. Urano também se apresenta assim inclinado, com seus polos voltados para o Sol e o plano de órbitas de seus satélites perpendicular praticamente ao plano de órbita dos planetas. Ou seja, o eixo de rotação de Urano é inclinado e quase coincide com o plano de translação do planeta.


Clyde Tombaugh

Plutão foi descoberto em 1930 pelo norte-americano Clyde Tombaugh (04/02/1906-17/01/1997), filho de um fazendeiro do Kansas, Estados Unidos. Naquela época havia uma corrida entre os astrônomos para se descobrir um outro planeta gigante como Urano e Netuno, numa tentativa de explicar as relações gravitacionais dos corpos do Sistema Solar naquela região. Não se descobriu nenhum gigante, mas depois se conseguiu explicar essas relações, mas o saldo foi a descoberta desse distante objeto, que por isso mesmo recebeu o nome de Plutão, o nome romano para o deus grego Hades, o senhor dos portões do “Mundo Inferior” ou da “Terra dos Mortos”. Alguns interpretam como sendo o “Inferno”, mas essa interpretação é mais uma visão distorcida do Cristianismo com relação à mitologia grega, que não se referia a diabos ou demônios ou infernos exatamente, como faz a mitologia cristã.


Caronte. A maior lua de Plutão.

Foi para esse distante mundo gelado que a sonda New Horizons se aventurou. E a medição exata do diâmetro de Plutão, que ainda gerava dúvidas, foi feita pela New Horizons. E ela realizou a medição, além de algumas fotos, horas antes de desligar os instrumentos de contato com a Terra. Nesse momento, ela também calculou com precisão a densidade de Plutão, valor que também se tinha dúvidas. E Plutão é de fato maior do que se supunha. Calculava-se seu diâmetro com cerca de dois quilômetros a menos.


Há alguns anos sugeriu-se que Plutão, embora um dos maiores objetos transnetunianos no Cinturão de Kuiper, um disco localizado além da órbita de Netuno, entre 30 e 50 UA do Sol e formado por muitos objetos, não era o maior. Se suspeitava que o planeta anão Eris, descoberto em 2005 e chamado por algum tempo de Xena, e que era mais brilhante que Plutão em alguns momentos, fosse maior. Hoje estima-se que ele tenha cerca de 2.238 km de diâmetro, sendo menor que Plutão. Assim, podemos dizer que Plutão é o maior corpo dessa distante e remota região do Sistema Solar. Aliás Eris, nome da deusa grega da discórdia, tem muito a ver com a nova classificação de Plutão de planeta para planeta anão. O nome Eris foi escolhido inclusive para refletir a discórdia gerada nesse processo.


A descoberta de Eris levou a toda uma discussão sobre planetas e de como conceituá-los. Pois quando se descobriu mais sobre o Cinturão de Kuiper e sobre Eris, imaginou-se que existissem muitos Plutões e corpos maiores que ele, como se acreditou que Eris fosse. Assim, uma das pautas da assembleia ou encontro da UAI (União Astronômica Internacional), realizado em 2006 em Praga na República Tcheca, era definir um novo conceito para planetas. E num dos critérios definidos pelos astrônomos no encontro, o de ser “dono de sua órbita” ou de “varrer sua órbita”, sem interferência direta de outros corpos, Plutão não se encaixava, até por estar em meio a muitos outros objetos similares a ele na mesma região. Assim, Plutão foi reclassificado, passando a ser um planeta anão e não mais um planeta. Hoje existem cinco planetas anões. Além de Plutão, Ceres no Cinturão de Asteroides entre Marte e Júpiter e, Haumea, Makemake e Eris, todos objetos do Cinturão de Kuiper, como Plutão, são planetas anões. Mas essa redefinição é bastante ambígua para muitos astrônomos, para quem Plutão continua sendo um planeta, não só pela tradição histórica na Astronomia do século XX, mas também por possuir atmosfera e estações do ano.


Disco da Voyager

Entre os “nove” planetas do Sistema Solar, apenas Plutão não havia ainda sido visitado por sondas terrestres. Para o Sol, 8 missões foram envidas para estuda-lo à distância adequada. Mercúrio recebeu duas visitas, e a primeira foi da Mariner 10 em 1973. Para Vênus enviamos 40 missões e a primeira foi a Mariner 2 em 1962. O planeta vermelho Marte, provável colônia terrestre num futuro bem próximo, foi visitado 38 vezes, e a primeira sonda a chegar lá foi a Mariner 4 em 1965. Os gigantes gasosos também foram visitados: Júpiter, 8 vezes, a primeira em 1973 com a Pioneer 10; Saturno, 5 vezes, a primeira em 1979 com a Pioneer 11; Urano, 1 vez, em 1985 com a Voyager 2; e Netuno, 1 vez também e com a mesma Voyager 2, em 1989. Até os cometas Halley e Churyumov-Gerasimenko foram visitados por sondas, sendo que para o segundo a viagem durou 10 anos e a sonda da missão Rosetta ainda pousou em sua superfície recentemente. Bem... agora chegamos à Plutão também...


Após passar por Plutão, a New Horizons irá viajar pelo Cinturão de Kuiper, disco com cerca de 35 mil objetos. Nessa distante e remota região, a NASA tentará direcioná-la para mais um objeto transnetuniano. Espera-se que ela passe perto de pelo mais um objeto dessa região e que o pesquise, colete dados. A NASA imagina que isso possa ocorrer até 2020. Em 2030 sua bateria deve acabar e depois irá rumar para fora do Sistema Solar.


Carl Sagan

Algumas sondas terrestres já foram ainda mais longe, mas não passaram perto de Plutão. É o caso das sondas Pioneer e Voyager. As sondas Pioneers 10 e 11 estão hoje a cerca de 15 bilhões de quilômetros do Sol e daqui mais ou menos 15 mil anos irão passar pela Nuvem de Oort, uma esfera constituída de cometas localizada no limite do Sistema Solar, na saída, a cerca de 20 trilhões de quilômetros do Sol. Já as Voyagers 1 e 2, que antes da sonda New Horizons eram as sondas mais rápidas construídas pelo homem, estão ainda mais longe, cerca de 20 bilhões de quilômetros do Sol, e levarão cerca de 10 mil anos para sair do Sistema Solar. A New Horizons, que chegou a atingir 58 mil quilômetros por hora, hoje está a uma velocidade de 50 mil quilômetros por hora. Todas essas sondas serão nossos desbravadores para além do Sistema Solar. Todas elas devem perder contato com a Terra por volta de 2030, mas por enquanto ainda emitem tênues sinais de vida.


Vitorio L. O. Zago

É professor, trabalha no Observatório Edmund Halley e é membro do Grupo Aster de Astronomia.

 
 
 

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